19.3.05

Histórias

Posted by Hello


Não conhecemos histórias normais. Aliás, essas não têm qualquer interesse...

Para a televisão, interessa mostrar desgraça, dor e sofrimento nos telejornais, e histórias de amor platónico correspondido, em telenovelas recheadas de personagens bipolares, sem densidade, nas quais não nos revemos. Sobramos, no meio de tudo, nós. Aqueles que têm vidas com outras paletas de cor, sem estilo, como histórias mal contadas ou contadas sem um ponto acrescentado. Então, muitos destes “gatos e gatas borralheiras” pretendem ser Cinderelas, viver outra história que não a sua, mergulhando num mar de tubarões, apenas porque mais ninguém ficou na costa…
As histórias verídicas que interessam têm preferencialmente como alvo, pessoas fora do seu contexto de vida. Como mães adolescentes. É a “tragédia”, o “fim de uma vida”, entre outros rótulos que caracterizam a gravidez precoce. Sou a favor da despenalização do aborto, mas a forma como estes casos são mostrados não ajuda mesmo em nada. Já alguma vez pararam para pensar em como a gravidez é vista nos dias de hoje? Raramente, é algo desejado! Mesmo quando falamos de casais estáveis, é quase sempre, uma má notícia, em vez de ser um sonho, porque, bem vistas as coisas, trata-se do nosso mais primário e instintivo sentido de vida. As pessoas “cinzentas” olham estes casos e da mesma maneira que se podem prevenir, podem adiar indeterminadamente relacionamentos, com o receio de ter filhos, essa “tragédia pessoal e intransmissível”.
Já vimos o oito, como é o oitenta? Basta repararmos na ficção. O argumento destas séries e novelas, portuguesas ou brasileiras e mexicanas, é sempre igual! Tratam-se de produtos de consumo em massa, por parte dos jovens, que mostram uma realidade com a qual só se identifica quem está iludido. Na minha escola, pelo menos, as pessoas não são todas fisicamente bonitas nem têm todas corpos esculturais… Bem como, as pessoas que agem de boa fé, nem sempre têm o seu esforço recompensado – na vida real, aquela que eu, tu, os meus e os teus amigos e família vivem, não triunfam os bons e morrem os maus. Imagine-se dois homens: um é trabalhador, dedicado aos filhos, afável para com as pessoas; o outro bate na mulher todos os dias, quando chega a casa bêbado, a mesma mulher que o sustenta. As vidas destes homens cruzam-se num choque frontal de automóveis, quando o bêbado conduzia em sentido contrário. As leis da física ditaram, porém, que o carinhoso pai não pudesse nunca mais abraçar os seus filhos, enquanto que ainda nessa noite, a mulher do homem violento foi, uma vez mais, brutalmente espancada… Abriu-se um processo pelo homicídio involuntário, derivado do acidente, processo esse que foi arquivado. O bêbedo morre velho, em paz, sem nunca ser julgado pelos seus males... Quem é que iria querer contar uma história destas? Não pode acabar assim, não é? Qual é a moral, qual é a justiça, no fim de contas?
Não há moral na história. Porque a vida é isso mesmo, um tsunami aleatório de vidas, cruel e sem nexo. Vidas como as dos “amigos do Martunis”, que não têm uma camisola da selecção portuguesa. Não merecem, também eles, uma casa e mobília? E porque é que essas figuras públicas, esses bancos e empresas solidários, não dão também um pouco do seu contributo aos desgraçados que vemos nas ruas, sem dinheiro, sem dignidade, sem nada?... São histórias que ninguém escuta, todos tapam os ouvidos, vendam os olhos. Quando as mostram, no último bloco dos telejornais, preferem ceder ao voyeurismo desacerbado e voraz de uma multidão, que em vez de querer prender o culpado, prefere ver o vídeo do cadáver ensanguentado, talvez para se sentir melhor consigo próprio, escalando no seu ego, através da miséria e da desgraça alheia. Festejemos, pois, centenários de velhas, intrigas de reality shows, operações plásticas de VIPs, entre outras histórias bonitas que, por certo, já vos contaram. O Mundo, esse, pode esperar…

3 comentários:

Anónimo disse...

mas o mundo não espera. vive mmo sob essa força sufocante. pq a natureza é o mais forte de tudo e temos que aprender a romper juntamente com ela. o importante será tentar escapar ao máximo da cultura de massas qdo n compreendida e bebida como coca-cola. mas a carne é fraca e as mãos pequenas...

Anónimo disse...

Eu não preciso de comentar, tu tiras-me as palavras da boca.

Anónimo disse...

tens razao, aliás como sempre... mas cuidado: muitas pessoas preferem viver uma vida k nao é a sua.. mas já te questionaste porquê? para algumas pessoas o mundo pode esperar porque o MUNDO, a VIDA já nao tem interesse.. e o refugio numa vida ficticia parece ser a soluçao.. assim as historias sao bonitas, ou pelo menos aparentam. nao julgues as gatas borralheiras k querem ser cinderelas, se calhar nao sao falsas nem ambiciosas, sao talvez apenas mentes perdidas, escondidas do terror da realidade..